Análise BD: Verão Índio e El Gaúcho

Mais uma reedição de dois nomes incontornáveis da BD. Se ainda não leram, aproveitem para descobrir estas duas obras desta dupla italiana. Leiam aqui a análise aos livros Verão Índio e El Gaúcho de Hugo Pratt e Milo Manara.

Mais uma vez os editores portugueses continuam a sua aposta em reedições de livros já largamente divulgados no mercado, optando por deixar de fora tanta coisa de boa qualidade que já foi ou vai sendo lançada em outros países. Desta vez falamos de duas obras de Hugo Pratt e Milo Manara: O Verão Índio e El Gaúcho.

Estas reedições apenas se justificam por estarem integradas numa coleção de obras completas de Hugo Pratt. Ambos os livros já foram editados, reeditados e reimpressos várias vezes e são presença regular nas bancas dos alfarrabistas, como se podia verificar na recente Feira do Livro de Lisboa ou nas estantes das Bibliotecas Municipais.

Por esse motivo não sei se esta é uma aposta em novos leitores, ou apenas algo destinado aos colecionadores das obras dos autores, que aparentemente ainda são muitos.

A descoberta de Hugo Pratt na revista Tintin portuguesa

Recordo-me do lançamento de Corto Maltese na revista Tintin portuguesa, muito motivada pela amizade entre Pratt e Vasco Granja. As críticas foram imensas, de um público espartilhado nas obras perfeitas da Linha Clara, dizendo que o desenho era péssimo e à base de borrões, não percebendo que a Banda Desenhada se faz da simbiose de várias coisas e não apenas com base em desenhos perfeitinhos. Felizmente que os tempos foram mudando e os públicos evoluíram.

Mas neste caso, o desenho até é demasiado perfeito nas personagens femininas. Como sempre Manara esmera-se na representação das mulheres, numa clara visão machista, mas o argumento de Pratt faz com que não sejam apenas esculturais bonecas, mas sim elementos fundamentais e essenciais para a história que lemos.

O tema principal é, em ambos os casos, o choque cultural entre colonizadores e nativos da América do Norte e da América do Sul consoante o livro. Apesar de diferentes, ambas as histórias têm muitos pontos comuns: violações, sexo (que é o combustível de variadas situações), desejo de liberdade, combates e a morte de protagonistas. Embora graficamente as melhores páginas de ambos os volumes sejam as cenas das batalhas entre os beligerantes das duas histórias, a complexidade dos argumentos não é facilmente percetível numa primeira leitura. Estamos a falar de obras com mais de trinta anos, mas que continuam a ser lidas como se fossem clássicos. O álbum de Verão Índio é de 1987 e o de El Gaúcho é de 1995. As personagens falam quase sempre diretamente para o leitor, como se estivessem num palco a representar uma peça de teatro. Foram as duas únicas obras que Pratt criou e não desenhou. Perdida ficou uma terceira obra da dupla, sobre um escravo no tempo do Império Romano.

Diferentes edições

Comparando com as anteriores edições portuguesas, encontramos várias diferenças. O tamanho dos livros atuais é um pouco maior, a tradução é ligeiramente diferente e a paleta de cores é um pouco mais suave. Mas a maior diferença no Verão Índio são três vinhetas que foram alteradas e uma que foi suprimida, à semelhança da versão francesa de 2002 que li. Estas alterações surgiram depois de várias críticas e pedidos para a modificação de algumas imagens de cariz sexual, que pelos vistos foram atendidas. Os mais curiosos podem sempre procurar as versões da Meribérica e comparar.

Quanto ao El Gaúcho, a única diferença é a introdução, que inclui mais esboços que a versão anterior.

Ambas as obras têm uma dinâmica de leitura muito grande, misturando páginas de grande beleza gráfica e sem qualquer texto, com outras em que o texto assume vital importância, mas sempre sem quebra de ritmo.

Os dois álbuns são em capa dura, com boa encadernação, de acordo com a coleção em curso. Páginas em papel brilhante de boa qualidade e com boa impressão. Preço de acordo com os outros livros da coleção.

Tempo de leitura:

Verão Índio – aproximadamente 40 minutos
El Gaúcho – aproximadamente 45 minutos

Dois livros para colecionadores e aficionados dos autores, ambos nomes de referência no universo da Banda Desenhada europeia. Esse é também um motivo para serem descobertos por novas faixas de público nesta bela edição da Ala dos Livros. Mas confesso que gostava de saber como seriam estas duas obras ilustradas por Hugo Pratt…