Bilheteiras: Cinema português mais activo do que vivo
Os dados divulgados pelo ICA (Instituto do Cinema e do Audiovisual) relativos aos primeiros seis meses do ano revelam um retrato preocupante do cinema português: apesar de estreias regulares e diversidade de temas e géneros, a larga maioria dos filmes continua a não encontrar o seu público. Poucas excepções indicam que há potencial, mas é preciso uma estratégia mais eficaz para converter investimento em relevância.

Em mais de 30 estreias nos cinemas, a produção portuguesa mais vista do semestre foi On Falling, com 12 406 espectadores distribuídos por 855 sessões. Um número “expressivo” que revela uma estreia impulsionada pelo apelo crítico, ainda que com uma média modesta de 14,5 espectadores por sessão. O filme, uma coprodução internacional com realização de Laura Carreira, explora temas de identidade e imigração.

Hotel Amor, de Hermano Moreira, continua em cartaz em várias salas do país e já soma 6 261 espectadores em 608 sessões. A comédia retrata as ligações humanas num espaço de turismo, funcionando como retrato contemporâneo subtil. Com uma média de cerca de 10,3 espectadores por sessão, o filme mantém uma carreira estável, graças à combinação entre um elenco com rostos bem conhecidos da televisão e promoção activa.

Na terceira posição surge Camarada Cunhal, de Sérgio Graciano, com 4 380 espectadores. Um retrato documental e dramatizado da figura histórica de Álvaro Cunhal, que conseguiu mobilizar um público politicamente interessado.
Hanami, de Denise Fernandes, é outra presença relevante, com 3 151 espectadores. O filme sobre a jornada da pequena Nana, na remota ilha vulcânica cabo-verdiana, resultou num poema visual do agrado das plateias.
ESTREIAS PORTUGUESAS MAIS VISTAS ENTRE 1 DE JANEIRO E 30 DE JUNHO DE 2025
# |
TÍTULO |
Nº SESSÕES |
ESPECTADORES |
1 |
On Falling |
855 |
12 406 |
2 |
Hotel Amor |
608 |
6 261 |
3 |
Camarada Cunhal |
547 |
4 380 |
4 |
Hanami |
370 |
3 151 |
5 |
Banzo |
190 |
2 956 |
6 |
Sonhar com Leões |
329 |
2 117 |
7 |
Portugueses |
340 |
1 755 |
8 |
O Palácio de Cidadãos |
106 |
1 495 |
9 |
A Savana e a Montanha |
139 |
1 480 |
10 |
Coro |
154 |
1 421 |
Dados ICA – Instituto do Cinema e do Audiovisual; Ordenado por número de espectadores.
Embora longe dos tops de espectadores absolutos, Nana Nana Meu Menino, de Carlos Moreira, destacou-se pela impressionante média de 39,1 espectadores por sessão. Com apenas 8 exibições, o filme atingiu 313 espectadores — prova de uma procura concentrada e mobilização local eficaz. Trata-se de um resultado impulsionado por sessões organizadas com dinamização.

Outros filmes com boas médias incluem Banzo (15,6 espectadores/sessão), um filme histórico ambientado numa ilha tropical africana, e Lulu (14,2), uma sátira à sociedade portuguesa actual que encontrou eco junto de públicos numa limitada janela de presença nos cinemas.

Muitos dos filmes estreados no primeiro semestre passaram completamente despercebidos, levantando sérias questões sobre a eficácia das estratégias de distribuição e comunicação. Os Infanticidas, de Manuel Pureza, registou apenas 70 espectadores em 32 sessões — uma média de 2,2. Também O Diabo do Entrudo, de Diogo Varela Silva, não foi além de 73 espectadores em 18 sessões (média de 4,1). Estes números apontam para uma total ausência de impacto, mesmo em contextos alternativos ou locais.
Perante o mesmo destino, referência ainda para Cartas Telepáticas, de Edgar Pêra (6,4 espectadores/sessão) e Caixa de Resistência (11,2). Em muitos casos, os filmes foram exibidos em sessões únicas ao final da tarde, com pouca promoção e escassos dias de oportunidade para os potenciais espectadores descobrirem as obras.
Estes resultados não se resumem a uma quebra de espectadores: configuram uma crise de relevância cultural e comercial. O cinema português, mesmo quando artisticamente competente ou criticamente reconhecido, continua a falhar na aproximação ao público geral. A produção existe, mas a visibilidade é escassa.
Estreias semanais, muitas vezes silenciosas e sem espaço no circuito comercial, dão a impressão de um cinema mais activo do que vivo — a produzir, mas sem ser visto.

Nos próximos meses, o cinema português continuará a marcar presença nas salas de cinema em Portugal, e aqui poderá conhecer alguns dos títulos antecipados.
Começou a caminhar nos alicerces de uma sala de cinema, cresceu entre cartazes de filmes e película. E o trabalho no meio audiovisual aconteceu naturalmente, estando presente desde a pré-produção até à exibição.