Análise BD: O Perigoso Pacifista
Passaram já mais de 50 anos, desde que os jovens portugueses usaram as canções como forma de desafio a um regime político cada vez mais fechado e repressivo.
Um dos elementos mais destacados desse movimento foi Adriano Correia de Oliveira, que agora mereceu o seu reconhecimento em banda desenhada.
Curiosamente, Adriano foi um dos mais carismáticos trovadores deste grupo, mas talvez por ter morrido precocemente, parece ter caído no esquecimento geral. Afinal já passaram 40 anos (uma geração!) desde o seu desaparecimento e talvez por isso eu esperava uma obra com uma maior preocupação em divulgar tão interessante personagem.
Aparentemente o livro não pretende ser uma biografia, mas sim um conjunto de episódios da vida de Adriano. Apesar disso eu esperava uma obra mais homogénea e não tão compartimentada. Os anos de 1960/61/62 e 63 são apresentados cada um em duas páginas, parecendo mais uma colagem cronológica que outra coisa. Nem sequer é referida a sua atividade desportiva, que na época mais não era mais do que uma forma dos jovens se reunirem sem levantar qualquer problemas com a polícia. Com certeza que haveria algum episódio para contar.
Por vezes a leitura não deve ser fácil para um jovem com menos de 40 anos. Toda a carga e significado de vários apontamentos gráficos e do argumento, só são identificados por quem viveu esse período ou passou por esses lugares, perdendo todo o significado para os restantes leitores, principalmente os mais jovens.
A questão estudantil coimbrã está muita vagamente apresentada, não sendo percetível a dimensão nacional que teve para quem não conhecer este período histórico.
Pena que a ligação dos episódios não seja mais fluída e melhor trabalhada, a fim de criar uma leitura mais contínua e interessante, até porque é bem evidente o trabalho de recolha e documentação por parte dos autores.
Teria sido preferível a redução de alguns episódios, como por exemplo a ida a Lisboa para beber um café, e em alternativa desenvolver o enquadramento, a motivação e as consequências das atividades musicais nesse período.
Também no período pós 25 de Abril, os autores resumem cinco anos de descoberta da liberdade conquistada com muita luta, e da concretização de vários projetos sonhados, a apenas três páginas sem nada de relevante.
A arte do livro enquadra-se na já conhecida obra de João Mascarenhas, apesar de por vezes parecer haver demasiada preocupação estética em detrimento do ritmo de leitura.
No final do livro surge uma biografia e uma discografia, bem como umas breves notas sobre as personagens que surgem no livro.
Totalmente incompreensível é a ausência de Manuel Alegre nesta relação de personagens. Ele foi dos melhores e mais ativos amigos de Adriano, e não por acaso este gravou três discos com textos do poeta.
Quanto ao CD que acompanha o livro, o mesmo é uma mais-valia. A escolha dos temas é a correta com alguns dos temas icónicos, representando vários períodos da produção do trovador. Porém acho que a opção devia ter sido de um cartão USB, um link ou um código QR para fazer download, atendendo que atualmente a quase totalidade de aparelhos reprodutores de som, já não têm leitor de CD. Se um dos objetivos é dar a conhecer este artista aos jovens, temos de lhes dar as ferramentas mais adequadas. Uma situação a pensar numa futura edição.
Livro em capa dura com boa encadernação, com páginas em papel baço de boa qualidade e boa impressão. Preço um pouco elevado, mas aceitável, atendendo que se trata de um conjunto de livro e CD.
Tempo de leitura:
• O Perigoso Pacifista – aproximadamente 40 minutos
No geral um livro que dá a conhecer alguns aspetos de uma figura que fez parte da história recente do país, mas que inexplicavelmente caiu no esquecimento.
O PERIGOSO PACIFISTA: Histórias de Adriano Correia de Oliveira
Paulo Vaz de Carvalho e João Mascarenhas
Editora: A Seita
Livro em capa dura com 58 páginas a cores nas dimensões de 21,5 x 28,5 cm
PVP: 17,50 €
Se não está a ler ou não tem um livro na mão… By Jove, algo se passa!!!