Cinema: Crítica – Babylon (2022)
O cinema como sétima arte sofreu inúmeras alterações permanentes ao longo da sua vida, desde da noção que para capturar cada segundo são necessários 24 fotogramas – 48 se forem Peter Jackson ou James Cameron – passando pela integração de som, música, efeitos visuais e especiais…
A lista é longa mas toda essencial para o que hoje chamamos de cinema. Damien Chazelle, conhecido pelo seu trabalho em Whiplash – Nos Limites e La La Land, traz-nos agora o que poderá ser uma das obra mais divisórias dos últimos tempos, com Babylon.
Acompanhamos a vida de Manuel (Diego Calva), um jovem imigrante, disposto a fazer tudo para concretizar o sonho de trabalhar em sets, seja de que forma for. É uma altura fascinante para o cinema, onde as estrelas da década eram reconhecidas como super estrelas máximas. Entre elas está Jack Conrad (Brad Pitt), um dos grandes e mais reconhecidos actores dos filmes mudos, com um poder de estrela grande o suficiente para encher as salas.
Pelo meio, também conhecemos Nellie LaRoy (Margot Robbie), uma rapariga que com a sua abordagem de “fingir a fama até atingir a fama”, faz com que ela se torne na mais recente sensação.
Acontece que esta era do cinema está prestes a sofrer uma das suas maiores evoluções, com a extinção do cinema mudo, para os chamados talkies, os cinemas com diálogos gravados, eliminando a necessidade de subtítulos nos filme, pondo toda uma indústria de pernas para o ar, eliminando de imediato qualquer ideia que tenhamos sobre a década de 20 e 30 ser mais glamorosa e decente, que os dias de hoje, repleto de excessos extremos.
No que é a sua carta de amor ao cinema, Chazelle oferece-nos aqui uma obra com muito para desempacotar. Por vezes demasiado, a um ponto exaustivo, mas de alguma forma, sempre cativante. É quase impossível não olharmos para o caos que o mesmo cria ao replicar as loucuras daquela era, quando as câmaras estão desligadas; e a magia que é criada quando se grita “luzes, câmara, acção”. Eventualmente “som” entra na lista de palavras, mas é uma mudança tão drástica que sente-se incomodativa enquanto a tecnologia dá os seus primeiros passos.
Estamos perante uma exploração de um grande grupo de pessoas, cuja existência no meio é para benefício individual, mas que contribui para o grande esquema que é a sétima arte. Tal como Manuel faz tudo para que alcance o seu objectivo, até americanizar o seu nome para Manny; Nellie está completamente cega na sua busca pela fama que está disposta a fazer quase tudo. Até existe tempo para explorar uma outra parte do cinema americano, onde músico negro Sidney Palmer (Jovan Adepo) chega ao estrelato com o seu talento, sofrendo também com uma indústria predominantemente caucasiana.
Há muito para processar em Babylon, e há aqui uma representação muitíssimo interessante da maior mudança da indústria, e a reacção daqueles que sentiram na pele todo o tipo de pressão para continuarem como o melhor talento durante a transição. É uma passagem que definitivamente não foi indolor, como é demonstrado no filme, onde as partes técnicas são bons exemplos de bom cinema, entre a realização, a cinematografia e o guarda-roupa. Até o elenco, na sua maioria, entretém devidamente, com uma atenção especial a Brad Pitt, que rouba todas as cenas de forma muito charmosa.
Por outro lado, há um enorme sentimento de pretensão reflectido no argumento – quase como se Chazelle estivesse a olhar para o espectador com um ar de superioridade – culpando-o por arruinar o estado do cinema com as suas vontades de ficar em casa a ver filmes nos serviços de streaming, ou ir até aos tais multiplex, apenas ver os grandes blockbusters, onde a preocupação aparente dos estúdios é qual o próximo filme de superheróis que irá fazer milhões de dólares. É algo que é nos esfregado no nariz múltiplas vezes, mas mal temos tempo para nos sentirmos insultados, porque rapidamente acontece algo incrível que nos distrai daquilo que estamos a pensar.
Nisto, Babylon é de facto um dos filmes que mais poderá dividir cinéfilos e espectadores casuais, fazendo um bom caso para ser um dos melhores e um dos piores filmes do ano. Mas é importante olhar para o que oferece na essência, e isso é ser um mero filme sobre a magia do cinema e o caos do mundo, injectado ambição e uma falas impressão de controvérsia, invés de demonstrar a sua humildade mediocre com mais orgulho. No fundo, é um pónei com sonhos de um dia ser um cavalo selvagem.
Nota Final: 7/10
Fã irrepreensível de cinema de todos os géneros, mas sobretudo terror. Também adora queimar borracha em jogos de carros.