Cinema: Crítica – Madame Web
Cassandra Webb é uma socorrista com um doloroso passado que regressa para assombrá-la quando descobre que consegue prever o futuro. A sua vida cruza-se com a de três jovens perseguidas por um vilão com temíveis poderes.
Universo Aranha da Sony
Este filme é mais um numa longa lista de “filmes do Homem-Aranha sem o Homem-Aranha” que a Sony Pictures tem vindo a desenvolver estes últimos anos, porque não quer de todo ajuda do monopólio Marvel para fazerem filmes giros, interessantes, ou pelo menos fieis às personagens. Recorrendo assim à matemática para resolver a equação apresentada à priori, tratam-se de “filmes”. Recorrendo por outro lado à história, torna-se tudo um pouco mais complicado.
Infelizmente o Venom deu aos responsáveis compinchas uma coragem desmedida, e o merecido sucesso dos “Aranha-versos” tem alimentado essa coragem, pois a equipa de produção continua a comparar os alhos, vulgo filmes criados por artistas capazes e apaixonados, com os bugalhos, vulgo o Morbius.
Madame Web é, portanto, um filme sobre personagens de série B do universo do Aranhiço. Personagens essas que são diluídas aos seus elementos mais básicos e reinventadas para caber neste argumento reciclado duma sequela qualquer do Final Destination. Num pequeno à parte, mais valia terem só feito um Final Destination.
Imaginem a Cassandra Cain em Birds of Prey mas agora são cinco.
As quatro protagonistas são geralmente afastadas da sua existência nas bandas desenhadas, personagens estas que são pré-mastigadas para caberem melhor no filme. Por outro lado, Ezekiel é um recorte de cartão daqueles que muito se veem no cinema, nomeadamente fora das salas, mas isso são detalhes.
Eu não vou dizer que sou o maior fã de um homem de meia-idade que anda descalço por Nova Iorque, porque é a internet e vai ficar aqui para sempre, mas o Ezekiel na BD é um contraste importantíssimo para o Peter Parker. Foi, afinal de contas, a primeira pessoa a perguntar ao Homem-Aranha “E se não foi um acidente? E se foste escolhido para isto?”.
Aqui temos um gajo rico (de onde veio o dinheiro?), que queria poderes (porquê?), e agora que os tem vai usá-los para finalidades nefastas (ok?).
Por sinal é interpretado por dois malandros, um ator de corpo muito manhoso, e um dobrador mais manhoso ainda. A dobragem torna-se principalmente problemática quando o espectador se apercebe de quantos enquadramentos omitem a boca de Ezekiel quando o mesmo fala.
Isto em específico distraiu-me imenso, mas não foi o pior que o filme nos deu.
O dicionário de Cambridge define “fan service” como “histórias, personagens, acções, etc. que são incluídas num filme(…) de forma a agradar os seus fãs.” Contudo Madame Web fez o impossível, desenvolveu fan-service que, ao contrário do seu original propósito, serve apenas para desagradar os fãs.
Inclusões de personagens secundárias e fatores externos ou aludidos que complicam desnecessariamente ou desvirtuam essas mesmas personagens e fatores. Tratam-se de inversões que não foram intencionais nem devidamente pensadas antes de serem incluídas no filme, levando os mais astutos a pensar “esta m**** não faz sentido nenhum”.
Pois não, foi por isso que eu me diverti no filme.
É uma parvoíce pegada, com representações quase exclusivamente más, não retirando de todo o merecido louvor ao entulho de argumento que para aqui inventaram. A fotografia quando não é lixo, consegue ser ainda pior salvo muito raras instâncias. Para cada plano visualmente interessante, há duas centenas de efeitos especiais manhosos e ângulos parvos ou sem sal. A certo ponto o filme ainda mete uma ou duas metáforas visuais que me alegraram, pois era precisamente o nível de estupidez que eu ansiava deste filme.
A música existe, e meteram a Toxic da Britney lá pelo meio. Não merece polegar, mas dou-lhe um encolher de ombros como respeito pelo esforço.
Já o guarda-roupa transcende o medíocre.
O spandex, que muito pouco se vê, recordou-me de “Los Luchadores”, uma série muito manhosa que tentava imitar os Power Rangers mas com ainda menos orçamento. Até os fatos fieis aos comics são desinteressantes e conseguem meter erros pelo meio, já o de Ezekiel é só “Homem-Aranha mau, mas não pode ser o simbionte”.
E assente nessa noção, se o Ezekiel tem um fato que lhe permite usar os seus poderes e afins, porque é que anda descalço? Mais a mais, porque é que só anda descalço em algumas sequências? Ele conduz no filme, será que conduz descalço? Ou guarda só um par de sapatinhos no carro para quando for conduzir?
Eu podia fazer uma Paranoia Coletiva só sobre isto, se o gajo já tem sapatos que lhe permitem trepar paredes quando está mascarado, porque é que anda descalço pela cidade fora??
E pronto, tão mau que é bom, mas não tão bom que valha a pena ver.
Como filme leva 2/10, contudo, como filme mau para rir um bocado com os amigos, Madame Web transcende qualquer métrica.
P.s: Se houver um Razzie para product-placement mais flagrante, está ganho.
Jovem dos 7 ofícios com uma paixão enorme por tudo o que lhe ocupe tempo.
Jedi aos fins-de-semana!