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Crítica – O Ano da Morte de Ricardo Reis (2020)

36 anos após o seu lançamento, chega-nos a adaptação de João Botelho do romance “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, de José Saramago. Numa estética a preto e branco, a narrativa decorre no regresso de Ricardo Reis (Chico Diáz), um dos três heterónimos de Fernando Pessoa (Luís Lima Barreto), a Portugal após o exílio de 16 anos no Brasil.

Contudo, a sua mente é perseguida pelo seu criador, Fernando Pessoa, que o força a discutir todas as suas ações e levando-nos a pensar quem está realmente ali apesar da visualmente vermos os dois. Formado em medicina, mas agora desempregado, Ricardo Reis levanta cada vez mais suspeitas sobre o seu regresso numa época conflituosa que aborda o  nazismo de Hitler, o fascismo de Mussolini e o Estado Novo de Salazar.

Conciliados a estes problemas, o protagonista tem o infeliz azar de se apaixonar, não por uma, mas por duas mulheres, Lídia (Catarina Wallenstein) e Marcenda (Victoria Guerra). Ambas conhece no Hotel Bragança, na rua do Alecrim, onde está hospedado durante a maioria do seu último ano de vida, 1936, um ano após a morte de Fernando Pessoa cujo faleceu em 1935. Porém, as classes etárias das duas mulheres são bastante distintas e a procura de Ricardo Reis em fazer a escolha acaba por dificultar a nossa empatia perante o protagonista. É interessante ver em como as duas mulheres têm as suas ideias e motivações, mas é um filme sobretudo focado em Ricardo Reis, deixando as restantes personagens secundárias com a função auxiliar para a sua narrativa.

Entre conflitos amorosos, políticos e de introspeção, João Botelho encontra a estética ideal de modo a fazer a homenagem certa a José Saramago, às suas personagens e à cidade de Lisboa. Desde a inevitável femme fatale que influencia as escolhas do nosso protagonista, as reações exageradas das personagens em grandes planos memoráveis que relembram o expressionismo alemão, ao contraste forte entre luzes e sombras, sombra esta que persegue Ricardo Reis como se fosse o próprio Fernando Pessoa, transições de cinema clássico ou, por fim, um dos pontos mais fascinantes, nomeadamente a meteorologia ser afetada pelo estado de espírito do nosso protagonista.

© Luisa Ferreira

Em suma, O Ano da Morte de Ricardo Reis é fundamental para quem não consegue a obra original e uma memorável homenagem ao cinema clássico. Contudo, é difícil simpatizar com um protagonista egocêntrico que nos força sempre a julgar as suas ações, tal como Fernando Pessoa faz ao longo do filme sobre o seu próprio heterónimo.

  • O Ano da Morte de Ricardo Reis (2020) estreia a 1 de outubro de 2020.

Classificação: 7/10

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