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Cinema: Crítica – O Golpe de Sorte

O Golpe de Sorte é uma farsa desgovernada entre a sátira social e a comédia tola.

O Golpe de Sorte

Pode não parecer, mas este O Golpe de Sorte (no original À l’ancienne) é uma espécie de remake, já que Hervé Mimran revisita uma fórmula bem conhecida do cinema britânico ao adaptar Waking Ned, de 1998, ao cinema francês. Nesta comédia, somos apresentados a dois reformados de uma aldeia isolada na ilha de Sein, Henri e Jean-Jean, que, após a morte súbita do verdadeiro vencedor do Euromilhões, decidem, com a ajuda dos habitantes locais, montar uma burla para ficarem com o prémio milionário. O filme insere-se na tradição das comédias sociais britânicas, misturando sátira à administração pública com o retrato de uma comunidade unida.

O cenário insular oferece um terreno fértil para o absurdo: telefones amolgados, internet improvisada, serviços públicos em ruína. Por detrás das piadas à moda antiga, o argumento evoca, com certo cinismo, a desertificação do mundo rural e o abandono dos territórios periféricos. Infelizmente, esse potencial dilui-se rapidamente numa narrativa sobrecarregada de reviravoltas inverosímeis e truques humorísticos gastos.

O Golpe de Sorte

A dinâmica entre Didier Bourdon e Gérard Darmon, juntos pela primeira vez no cinema, poderia ter sustentado o filme. Apesar de o duo demonstrar uma energia evidente, a sua interpretação perde-se muitas vezes em exageros burlescos: dentes pintados com marcador preto, perseguições ridículas e humor escatológico minam a elegância da premissa. O argumento, assinado por Igor e William Gotesman, carece de rigor, acumulando inverosimilhanças em detrimento da coerência.

A realização luta para impor um ritmo consistente e as personagens secundárias — apesar de promissoras, como uma investigadora do Euromilhões com faro hipersensível — são deixadas ao abandono. Alguns momentos, como a corrida final entre uma scooter para deficientes e uma mota, poderiam ter sido o auge de um absurdo bem conseguido, mas ficam-se pela intenção.

O Golpe de Sorte

Em suma, O Golpe de Sorte oscila entre crítica social e vaudeville rural, sem nunca acertar no tom. O filme, apesar de alguns lampejos cómicos e da beleza selvagem da ilha de Sein, afunda-se numa farsa pesada, onde a leveza resvala demasiadas vezes para a caricatura. Uma oportunidade desperdiçada por uma comédia que prometia bem mais.

Nota: 4/10

 

António Moura

Um pequeno ser com grande apetite para cinema, séries e videojogos. Fanboy compulsivo de séries clássicas da Nintendo.

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