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When Harry Met Sally… – O Amor, por Rob Reiner

Aproveitei este final de ano, marcado também pela recente e infeliz morte do Grande Rob Reiner (This Is Spinal Tap, Stand by Me, The Princess Bride), para regressar a When Harry Met Sally…, um filme que continua a resistir ao tempo com uma elegância rara dentro das comédias românticas. Revê-lo hoje não é apenas um exercício de nostalgia, mas uma forma de perceber como certos gestos de escrita, de encenação e de observação humana permanecem vivos quando assentam numa estrutura rica e emocionalmente verdadeira.

Os diálogos são, desde logo, o grande foco do enredo. Sustentam-no sem nunca soarem maçudos ou regurgitados, como acontece em tantos romances contemporâneos, onde cada fala parece excessivamente polida, consciente de si mesma, quase em competição com o espectador. Aqui, em vez de discursarem para um público invisível, Harry e Sally falam como pessoas reais, instruídas, espirituosas, cheias de manias e contradições. Essa naturalidade, aliada ao ouvido preciso da argumentista Nora Ephron para o ritmo da conversa quotidiana, cria o equilíbrio entre o humor, a observação social e a intimidade.

How When Harry Met Sally Used Visual Spacing To Tell a Story
O filme distingue-se também pela forma subtil como contorna estereótipos de género. Sally é ambiciosa, organizada e exigente, mas não abdica do amor nem do sentido de ridículo. Harry, inicialmente cínico e desconfiado do compromisso, acaba por reconhecer a sua importância e expor uma vulnerabilidade que converge com uma corrente cinematográfica específica, centrada na maturidade afetiva em contextos cosmopolitas como Nova Iorque.

Nesse sentido, a cidade é mais do que cenário, revelando-se como presença palpável. A câmera capta-a nas suas estações, nos seus cafés, nas suas ruas e nos seus sons, construindo uma verdadeira ode ao espaço urbano como lugar de encontros, desencontros e reinvenções pessoais. Locais como o Katz’s Delicatessen tornaram-se icónicos não por fetichismo, mas porque estão organicamente integrados no imaginário coletivo.

See Billy Crystal return to 'When Harry Met Sally' restaurant Katz's Deli

O ritmo é outro dos trunfos da trama. Desde o início, coloca os protagonistas em contacto e confronto direto, sem rodeios. Os saltos temporais são fluidos, cheios de conteúdo e nunca se arrastam. Há uma sensação constante de avanço, de acumulação de experiência e de tempo vivido, sem recorrer a subterfúgios.

As personagens secundárias, interpretadas por Carrie Fisher e Bruno Kirby, antecipam um modelo que viria a ser replicado até à exaustão: os melhores amigos engraçados, cúmplices e confidentes. Aqui, porém, surgem com um frescor genuíno, contribuindo para uma aura de proximidade e humor que lhe amplia a dimensão humana.

How the Four-Way Phone Call in 'When Harry Met Sally' Was Shot in a Single  Take

Por fim, sendo esta uma comédia romântica, é impossível ignorar a química entre Meg Ryan e Billy Crystal. Além de estar presente nos diálogos, está também nos olhares e nos pequenos gestos. O contexto pessoal de Reiner durante a produção, apaixonado na vida real, acabou até por influenciar decisivamente o desfecho da história, transformando um final inicialmente mais amargo numa celebração sincera do amor adulto. Talvez seja essa mistura de rigor e impulso emocional que torna When Harry Met Sally… tão duradouro.

Classificação: 9/10

Pedro Rolino

Fascinado por cinema desde cedo, começou pelas cassetes VHS de casa da avó e acabou a colecionar figuras de clássicos dos anos 80. Hoje, vê cada filme com a mesma curiosidade de então.

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