Análise – “Mata! Mata! – A Viagem de Wargus”
“Mata! Mata! – A Viagem de Wargus”, de Jaime Freire, editado pela Douda Correria, faz-me lembrar um manifesto surrealista, não apenas pelas ilustrações únicas de Nuno Freire, mas também pela audácia e ausência de normalidade em cada uma das viagens que Wargus, o nosso protagonista, toma no seu caminho.
Trata-se quase de um diário acerca das jornadas de Wargus, cada uma delas surpreendentes, com uma narrativa fantástica que aborda perigos, descobertas e encontros a repetir.
O leitor é convidado a seguir diferentes e desordenados capítulos da vida do protagonista, todos eles na sua condição de missionário e aventureiro. Conhecemos criaturas extraordinárias e mundos desconhecidos, alguns inóspitos, outros hospitaleiros.
A um canto da nave encontrava-se uma mulher deitada sobre o que parecia ser um
túmulo. Levitei na sua direção. Estava completamente nua e era jovem e muito bela.
Tinha a cabeça rapada e usava uma pulseira no tornozelo esquerdo. Fiquei preso à sua
figura. Amava a beleza, esta beleza alienígena, e por um momento esqueci tudo. Beijei-
a na face e soube então que estava morta. Reparava agora na marca de uma mordedura
de serpente localizada um pouco acima da pulseira que usava na perna. Larguei a
coronha do arco e abracei-a muito como se fosse um íncubo. Não havia aqui nada de
simbólico. A sua infinita solidão emocionava-me.
Para além dos aspetos surreais já mencionados, o Sci-Fi influencia também as imagens e detalhes de cada conto, entre uma mistura de universos medievais e espaciais.
As ilustrações são soberbas, a preto e branco, mas de leituras bem coloridas, as linhas dos desenhos pensam o espaço em que a ação decorre e acompanham perfeitamente as palavras. As formas dos locais e as suas figuras sublinham a poética textual.
Nada está desconexo ou a mais, tudo encaixa. Isto pode parecer irónico num livro que reflete e projeta múltiplas e diversificadas ideias, porém achamos sempre coerência entre traços e frases.
Concluímos que “Mata! Mata! – A Viagem de Wargus”, é um cenário sem limites, faltam criações assim, que testem a fronteira e mirem sem medo. Entre tantas caixas, é bonito achar conteúdo fora da caixa, sem caixa.
Jaime Freire, Escritor e Advogado, nasceu em Lisboa e vive na Figueira da Foz. Publicou, entre outros, os seguintes livros de ficção: O Homem da Superfície (Editorial Escritor), Conversa Na Ilha da Jana (Black Sun Editores), Os Dragões de Komodo (Black Sun Editores), Any Time is Tee Time (Angelus Novus) e A Japonesa Nua (Ed. de Autor). É também autor de vários ensaios jurídicos, como por exemplo O Desespero em Direito Penal (Julgar online).
Autor: Jaime Freire
Ilustração: Nuno Freire
Género: Fantasia, Sci-fi
Editora: Douda Correria
Argumento: 8
Arte: 9
Veredito final: 8
Atriz e professora. Da marginalidade à pureza gosto de sentir tudo. Alcanço o clímax na escrita. Sacio-me com a catarse no teatro. Adiciona-se uma consola, um lightsaber, eye makeup quanto baste e estou pronta a servir.*De fundo ouve-se Fix of Rock’n’Roll, de The Legendary Tigerman*